por Reverendo Kanji Tamura, Universidade Rissho
Mútua Posse dos Dez Reinos (II)
A prática de entoação do Daimoku ensinada por Nichiren Shonin ou suas atividades missionárias reais é baseada na doutrina dos “Três Mil Mundos Contidos num Único Pensamento” significando que todos os mundos existentes estão contidos em nossas mentes a todo momento. O símbolo numeral de “3.000” é obtido pela multiplicação das categorias conceituais da existência: “Mútua Posse dos 10 Reinos (10×10), Dez Aspectos e Três Fatores das Existências”.
Enfatizando a importância da “Mútua Posse dos Dez Reinos”, Nichiren Shonin escreveu em seu “Kaimoku-sho (Abra Seus Olhos)”, “O ensinamento dos 3.000 mundos em um pensamento é baseado nas características mutuamente possuídas do Dez Reinos”.
O ensinamento da “Mútua Posse dos Dez Reinos” significa que cada um dos dez reinos dos seres vivos (inferno, espíritos famintos, bestas, demônios asuras, seres humanos, seres celestiais, sravaka, pratyekabuddha, bodhisattvas e Budas) contém as características dos outros nove reinos. Portanto, os habitantes do inferno possuem as mentes dos espíritos famintos, bestas ou seres humanos, e dos Budas ainda que seja muito sutil. Portanto, essas mentes se tornam os fatores para que eles progridam em direção aos reinos superiores, abrindo o caminho da salvação.
Entretanto, o Buda é capaz de conseguir a salvação dos habitantes do inferno porque o reino dos Budas também possui a mente do inferno de forma sutil. Em outras palavras, todos os seres vivos, incluindo nós mesmos, possuem a Natureza do Buda (a qualidade original do Buda) como também a qualidade do inferno.
Não nascemos bons ou maus. Nosso modo de viver é decidido, em vez disso, dependendo da mente que cultivamos, do estado mental entre os Dez Reinos que tentamos criar.
Nichiren Shonin afirma em seu “Kanjin Honzon-Sho (Um Tratado Revelando a Mais Venerável Contemplação Espiritual)”, “Ficar zangado é o inferno, ser ganancioso é o reino dos espíritos famintos, ignorância é o reino das bestas, ser perverso é o reino dos demônios asuras, ser pacifico é o reino dos seres humanos, ficar satisfeito é o reino dos seres celestiais, perceber a transitoriedade da vida é o reino dos sravaka e pratyekabuddha e a mente de compaixão é o reino dos bodhisattvas”.
Cada ser humano apresenta uma característica diferente. Alguns são passionais, mas outros são excêntricos, animados ou simpáticos. Cada um de nós possui as várias características dos Dez Reinos e a diferença de sua mistura se reflete em cada personalidade. Qualquer pessoa de caráter, inevitavelmente, possui uma mente má ainda que seja bem reduzida e qualquer pessoa perversa tem uma mente virtuosa, por menor que seja. Seria a invocação do inferno entre os seres humanos recorrer a violência, planejar atos terroristas ou guerras, enquanto a mente que ora pela paz mundial seria a invocação da compaixão dos bodhisattvas. Portanto, é essencial para nós, educar uma pessoa ou conduzir a sociedade na direção certa, ou seja, nutrir a Natureza de Buda e eliminar a natureza maléfica dentro de nós.
Nichiren Shonin disse que o reino dos Budas é altamente difícil de se manifestar entre os Dez Reinos. Em outras palavras, ele quis dizer que é difícil realizar a Natureza do Buda em nós, mas, o fato de mantermos a fé no Sutra do Lótus mostra que o reino dos Budas está contido no reino dos seres humanos. Nichiren acrescentou que, como Shakyamuni, que nasceu no reino dos seres humanos e se tornou o Buda, nós deveríamos acreditar que o reino dos seres humanos possui o reino dos Budas. Recebendo e sustentando o Daimoku, Nichiren afirma que, todos nós obteremos os méritos do reino dos Budas de Shakyamuni.
Os Dez Aspectos (1)
Os Dez Aspectos são as condições reais da existência de cada ser vivo nos Dez Reinos. Dado que cada existência viva é composta pelos dez elementos, estes são chamados de 10 aspectos, que estão descritos no capítulo 2 “Expedientes” do Sutra do Lótus:
1- As Aparências: as aparências externas de todos os seres.
2- As Naturezas: a qualidade interna, a mente e a índole de cada ser. As aparências e as Naturezas são inseparáveis. Por exemplo, na face ou forma de uma pessoa, sua personalidade e sua qualidade são inevitavelmente refletidas.
3- Entidades: as substâncias que consistem nas aparências e naturezas. Como a substância, o corpo e a mente de cada existência que compõe um indivíduo.
4- Os Poderes: a energia interna, motivação ou desejo. Significa a energia interna que gera ação ou desenvolvimento para fora.
5- As Atividades: a condição que os poderes está sendo desenvolvida ou praticada para fora. O desejo causa atividades e as atividades devem ser baseadas na função do desejo ou motivação e a base que forma o desejo depende da natureza de cada ser.
6- A Causa Primária: a causa (direta).
7- Causas ambientais: as causas secundárias que afetam os resultados, ajudando a Causa Primária.
8- Os Efeitos: o resultado formado pelas Causas Primária e Ambiental.
9 – As Recompensas e as Retribuições: os resultados secundários originam-se dos Efeitos. Procurando as causas de “apanhar um resfriado”, podemos encontrar uma causa primária de “permanecer num lugar frio por longo tempo” e uma causa ambiental de “não condicionar o corpo depois”. Os resultados de “apanhar um resfriado” pode atrair o resultado secundário “de tirar um dia de folga” e assim por diante.
Igualmente, todas as coisas neste mundo estão conectadas como uma corrente pelas Causas Primária, Ambiental, Efeito, Recompensas e Retribuições. Portanto, procurar os bons Efeitos, as boas Causas Primárias precisam estar enraizadas e as Causas Ambientais precisam estar conectadas à anterior. Então, através dos bons efeitos conquistados, surgirão as melhores Recompensas e Retribuições. Esta é a lei (de Causas e Efeitos). Desta forma, quando alguém tenta melhorar a si mesmo, os bons resultados não podem ser percebidos quando se faz o mesmo que antes, sem tentar fazer algo novo.
10 – A igualdade dos Nove Aspectos: os nove elementos desde as Aparências até as Recompensas e Retribuições não podem ser separados e, em última análise, são um elemento. Quando o praticante aprende a relação entre estes Dez Aspectos, ele pode observar todos os seres vivos, compreender suas várias circunstâncias completamente e por fim conduzi-los ao Caminho Budista. Este é o ensinamento dos Dez Aspectos.
Os Dez Aspectos (2) – Refrão por Três Vezes
A prática de entoação do Daimoku ensinada por Nichiren Shonin, é a integração do mundo das “Três Mil Existências Contidas num Único Pensamento,” significa que nossas mentes contém os três mil mundos: o universo inteiro. O símbolo numeral de 3.000 origina-se da multiplicação das categorias conceituais da “mútua posse dos dez reinos”, “dez aspectos das existências” e “três categorias do reino”. “Mútua Posse dos Dez Reinos” significa que todos os seres vivos podem ser classificados entre 10 tipos de existências, do inferno no fundo até o reino dos Budas no topo, pois cada um deles contém as características dos outros nove reinos dentro de sua mente, de modo que as mentes de todos os seres vivos estão inter-relacionadas entre si e, por último, unidas em um elemento. Os “Dez Aspectos das Existências” descrevem as condições reais de cada ser vivo nos dez reinos. Ou seja, cada um deles é originalmente equipado com os dez aspectos de aparências, naturezas, entidades, poderes, atividades, causas primárias, causas ambientais, efeitos, recompensas e retribuições, e igualdade dos nove aspectos acima. As “Três Categorias do Reino” significa três mundos. Ou seja, as existências inteiras no mundo são divididas entre três categorias: cada ser vivo, seu corpo e mente como a substância e os ambientes onde todos os seres vivos existem. Quando estas “três categorias do reino” são combinadas com a multiplicação da “mútua posse dos dez reinos” e os “dez aspectos das existências”, é revelado que o fluxo de um pensamento nosso não está apenas conectado e unido com cada movimento do corpo e da mente de todos os seres vivos, mas também se espalha por todo o mundo ambiental que nos rodeia.
No texto anterior, descrevemos cada um dos “dez aspectos das existências”, e agora gostaríamos de explicar o significado de “refrão por três vezes”. Quando recitamos o Sutra do Lótus, capítulo 2 “Expedientes”, devemos ler a parte que descreve os dez aspectos por três vezes. Este “Refrão por Três Vezes” representa a “tríplice verdade do vazio, da transitoriedade, e do caminho do meio”.
O Grande Mestre T’ien-t’ai demonstra a unificação de todos os sutras (todo o Budismo) pelo Sutra do Lótus e descreve a prática budista e os conteúdos da iluminação em três etapas.
1- Primeiro de tudo, um budista praticante deve tentar melhorar a si mesmo e buscar a liberdade espiritual descartando todos os maus desejos ou apego. Para eliminar o apego, o praticante deve contemplar a seguinte premissa que enfatiza: “Todas as coisas no mundo são transitórias, elas apenas existem temporariamente devido as causas primária e ambiental e sua substância é vazia; nada existe para sempre”. Esta premissa é chamada de ‘a contemplação do vazio’ e praticando esta contemplação, o praticante percebe a verdade do vazio.
2- Todavia, quando observamos o mundo real, há seres vivos se perdendo e sofrendo, ligados unicamente ao presente. Para acudir e guiar tais seres vivos, o praticante deve mergulhar novamente no mundo transitório existente, compartilhando o mesmo ponto de vista com eles e conduzi-los ao Caminho Budista. Deste modo, voltar ao ponto de vista dos seres vivos e observar as coisas a partir dele é chamada de a contemplação da transitoriedade e a condição do mundo real revelada por esta contemplação é chamada de ‘a verdade da transitoriedade’.
3- Um praticante, ao melhorar a si mesmo e aprimorar sua prática ao guiar os outros, deverá ser capaz de realizar a contemplação do caminho do meio, verdadeiramente livre e universal, o que poderia sinalizar o vazio bem como a transitoriedade sem estar atado a nenhum destes pontos de vista. Com esta contemplação do caminho do meio, pela primeira vez, a essência deste mundo inteiro (a verdade do caminho do meio) seria revelada. Dizem que este é o estado no qual todas as coisas estão harmoniosamente fundidas e unidas.
Praticar estas três contemplações do vazio, transitoriedade e caminho do meio passo a passo é chamada de ‘as três contemplações da gradação’. Os estados da verdade tríplice conquistados através das três contemplações da gradação é literalmente gradual e cada um dos três estados parecem ser diferentes um do outro, de modo que são chamados de a tríplice verdade do isolamento, onde cada um deles é contrastante e separado. Isto ainda é um estado imperfeito de iluminação.
Posto que, quando o praticante se dedica à pratica das três contemplações mais profundamente, em algum momento, ele seria capaz de analisar as três perspectivas do vazio, da transitoriedade e do caminho do meio simultaneamente. Isto é chamado de as três contemplações de uma mente. Apesar das três contemplações de uma mente, aparece o estado de iluminação genuína chamado de ‘a tríplice verdade da assimilação harmônica’, onde as verdades do vazio, transitoriedade e caminho do meio são compativelmente unidas. A contemplação do vazio é negação total, enquanto a da transitoriedade significa afirmação total. Consta que a contemplação do caminho do meio é o estado real de iluminação que aparece através da negação e da afirmação. A razão pela qual os dez aspectos é lido três vezes é que a existência inteira revelada através dos 10 aspectos originalmente indica o estado da tríplice verdade da assimilação harmônica do vazio, da transitoriedade e do caminho do meio. Além disso, o universo inteiro desvendado por ICHINEN SANZEN é, em parte, o estado da tríplice verdade da assimilação harmônica do vazio, da transitoriedade e do caminho do meio.
Porém, é difícil para nós imaginar o estado da “tríplice verdade da assimilação harmônica do vazio, da transitoriedade e do caminho do meio” na prática. Por exemplo, há uma xicara de café, a qual adicionamos leite e mexemos bem. Este fluido, café e leite, pode ser considerado café ou leite. Ao mesmo tempo, pode-se dizer que é café e leite. Ainda assim, há leite nele, então poderíamos literalmente dizer “não é café”. Ao mesmo tempo poderíamos dizer “não é leite”. De certo modo, poderíamos dizer “não é café nem leite”. Quando descrevemos em uma palavra, é “café latte”. Igualmente, vamos imaginar que todas as existências consistem em fundir e unir. Como mostra o exemplo acima, a tríplice verdade da assimilação harmônica é revelada sob pilhas de negação e afirmação.
Embora todas as existências no mundo sejam diferentes umas das outras, elas existem fundindo-se e unindo-se e sendo assimiladas intimamente às nossas mentes. Pensar assim é a base da doutrina das “3.000 existências contidas em um pensamento”.
(*) Textos publicados no Nichiren Shu News de outubro e dezembro de 2004 e traduzidos pela equipe de traduções da Nichiren Shu Brasil em agosto de 2019.
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