Todos procuram a felicidade, mas a verdadeira felicidade é difícil de ser encontrada e ainda mais difícil de ser mantida. Com muita frequência se frustram os nossos esforços em encontrar satisfação duradoura e completa, e muitas vezes nos perguntamos por que não podemos ser o tipo de pessoa que queríamos ser e realizar nossos sonhos. Claro que, mesmo se formos capazes de encontrar felicidade e mantê-la, inevitavelmente virá o dia em que teremos de deixar tudo por causa da velhice, doença ou morte.
2500 anos atrás, um príncipe indiano chamado Siddharta Gautama refletiu sobre esse assunto. Ele percebeu que a vida luxuosa que tinha e a promessa de um grande poder terreno não ia ajudar a responder o problema sobre encontrar verdadeira e duradoura felicidade, que pudesse romper até mesmo a barreira da morte. Para encontrar essa resposta, ele deixou seu palácio e por seis anos viveu como um asceta uma vida de auto negação que tinha como objetivo descobrir a vida eterna que a sua vida de auto-indulgência não tinha sido capaz de revelar. No fim, ele descobriu que a auto negação, bem como a autoindulgência, não era a resposta. Ele descobriu o Caminho do Meio que está além dos dois extremos e consiste em colocar o ego de lado para ver claramente a vida como ela é.


Quando Siddharta Gautama percebeu a futilidade da auto-indulgência e da autonegação, se sentou debaixo de uma árvore (que viria a ser conhecida como Árvore Bodhi) determinado a não se levantar, até que ele visse por si próprio a verdade sobre a vida e a morte. Então durante a noite ele revisitou toda sua vida e, com uma mente refinada e reforçada pelos seus passados seis anos de disciplina e concentração ascética, foi capaz de analisar todas as suas vidas passadas e também as dos outros. Ele percorreu a rede de causa e efeito que leva as pessoas a criar inconscientemente seus destinos. Indo ainda mais profundamente, se livrou da natureza carente de um “eu”. Ele viu que todos os seres e todos os fenômenos surgem em concordância com causas e condições. Todas as coisas estão ligadas, em uma grande e universal rede de causas e efeitos. Tudo o que existe, existe como uma breve manifestação de um mundo interdependente e dinâmico que é a verdadeira realidade de todas as coisas.


Após alcançar esta compreensão, Siddharta Gautama despertou do sonho de ser um “eu” independente com seu sofrimento, vulnerabilidade e inevitável declínio. Nessa altura se libertou, acordou, se iluminou. Desde então, ele se tornou Buda, que significa “desperto”. Ele também começou a ser chamado de Shakyamuni, que significa “O Sábio do Clã Shakya”.


A princípio, o Buda Shakyamuni não estava certo de que poderia ser capaz de partilhar com outros a compreensão sobre verdadeira natureza da vida para a qual ele tinha acordado. Ele sabia que as palavras nunca poderiam alcançar essa verdade.


Felizmente para nós, o Buda teve a compaixão e a capacidade de fazer uma tentativa, usando palavras para guiar as pessoas para além das palavras. A principio, tinha que explicar o que ele fez em termos muito práticos. Então, explicou em termos de Originação Dependente. Esta é a ideia de que todas as coisas surgem na dependência de causas. Na sua forma mais simples e mais abstrata, significa que se existe uma coisa, essa dará lugar a outra, e sem a primeira, não haverá a segunda. Esta lei de causa e efeito basicamente significa que todos têm o que merecem. Se você tem sementes de maçãs, colherá maçãs, se você planta pêras receberá pêras. Se você não tiver as sementes das maçãs, não poderá colher maçãs. Do mesmo modo, nossas vidas são como o solo e se semearmos ganância, ódio e ignorância, depois iremos colher todos os tipos de perda, confusão e violência. Por outro lado, se semearmos carinho, compaixão, e a paz, então iremos colher boa sorte e felicidade. Evidentemente, a vida não é assim tão simples e a lei de causa e efeito funciona para além do curso de uma única vida, de acordo com o Buda Shakyamuni.


Essa foi uma nova maneira de pensar para muitas pessoas. Ainda hoje, muitos tendem a pensar que a vida é aleatória e sem significado ou controladas pelas forças impessoais do destino ou por um deus pessoal e inescrutável. Em oposição a estas ideias, o Buda pensou que nós próprios criamos nossa própria felicidade ou infelicidade através das causas que fizemos. O Buda ensinou: “Se você quer saber que era no passado, observe as condições da sua vida presente, e se você quiser saber como isso vai acabar no futuro, olha o que você está fazendo neste momento.”

As Quatro Nobres Verdades de Buda foram uma aplicação específica desta lei, que ele ensinou para ajudar as pessoas a entender que elas tinham de se libertar das cadeias de causa e efeito forjadas pela ignorância dessa verdade.


A primeira nobre verdade é que a vida é cheia de sofrimento – raramente obtemos o que queremos e, inevitavelmente, perdemos o que temos.


A segunda nobre verdade é que o sofrimento é o efeito de nos apegar ao que não podemos ter e a ignorância que nos impede de ver isso.


A terceira nobre verdade é que o sofrimento pode terminar. Esta libertação é conhecida no budismo como Nirvana. Especificamente refere-se à extinção das chamas da ganância, ódio e ignorância e do sofrimento que provocam.


A quarta nobre verdade é o caminho óctuplo que é a causa que leva à libertação do sofrimento.
O caminho óctuplo consiste em entendimento correto, pensamento correto, linguagem correta, ação correta, modo de vida correto, esforço correto, atenção plena correta, concentração correta.
Não entraremos em cada um deles, mas para simplificar as coisas explicaremos em termos de três práticas: disciplina, meditação e sabedoria.


Disciplina significa evitar matar, roubar, ter comportamento sexual inadequado, mentir, usar linguagem abusiva e usar palavras preconceituosas. Em vez disso, tentar tratar os outros com amor e carinho. Meditação significa que temos de controlar não só as nossas ações, mas também as nossas mentes. Em vez de uma mente distraída, ou uma mente fechada e rígida, temos de cultivar um espírito forte, aberto e generoso, capaz de se concentrar no que está acontecendo ao nosso redor e dentro de nós, para discernir a verdade da ilusão. Finalmente, através do cultivo da autodisciplina e meditação, podemos ver a verdade sobre a vida. Podemos ver que o “eu” efêmero e as coisas exteriores a nós, que são igualmente inconstantes, são incapazes de nos dar uma satisfação duradoura.


Através da sabedoria somos capazes de ganhar a perspectiva que necessitamos para acabar com a nossa falsa dependência de um “eu”. Ao fazê-lo há a libertação. Assim, podemos entrar numa nova relação com nós mesmos, que não está preenchida com falsas expectativas, mas em vez disso, é caracterizada pela criatividade, compaixão e uma renúncia não egoísta de si mesmo em favor de toda vida. Esta prática tríplice, que é o caminho óctuplo, é a maneira através da qual podemos viver de acordo com a lei de causa e efeito, evitando fazer más causas, fazer boas causas e purificar as nossas mentes.


Desde o momento que o Buda Shakyamuni ensinou a Originação Dependente e as Quatro Nobres Verdades, aqueles que foram inspirados pela sabedoria e praticidade desses ensinamentos têm demonstrado a sua confiança e a vontade de continuar a sua prática, tomando o Triplo Refúgio. O Triplo Refúgio é constituído por abraçar o Buda, o Dharma e a Sangha como os três tesouros, que podem nos libertar do sofrimento e encontrar verdadeira felicidade para nós e para outros.


Ao tomar refúgio no Buda, nós estamos dizendo que é absolutamente possível que um homem desperte para a verdade sobre a vida e encontre a verdadeira felicidade, e que, se o Buda Shakyamuni foi capaz de fazê-lo, nós também podemos.


Ao tomar refúgio no Dharma estamos afirmando que aquilo que o Buda ensinou é baseado na experiência direta da verdade e que irá também nos permitir ver essa verdade.


Ao tomar refúgio na Sangha (a comunidade que apóia o ensino do Buda) estamos dizendo que esses ensinamentos foram passados para nós, como parte de uma tradição viva que tem experimentado e sustentado estas lições e que agora nós podemos ser parte dessa tradição viva.


Temos a intenção de partilhar os três tesouros com outros e ajudar todos os que desejam seguir a prática tripla. O que afirmamos é comum a todos os budistas, mas o Budismo de Nichiren especificamente confia no último e mais importante ensinamento de Buda tal como é ensinado no Sutra do Lótus e transmitido para nós através do exemplo de Nichiren Shonin, um monge e reformador religioso do século 13 no Japão. O Sutra do Lótus ensina duas coisas muito importantes nas quais podemos confiar enquanto seguimos os ensinamentos de Buda.


A primeira é que todas as pessoas (na verdade, todos os seres) independentemente da sua capacidade ou antecedentes, tem a natureza de Buda em si. Em outras palavras, todos tem a capacidade de despertar para a verdade e obter a libertação, tal como fez Buda. A segunda é que a vida iluminada de Buda não se limita ao passado, mas é uma parte integrante da realidade em si, independentemente do tempo e lugar. A iluminação do Buda é também a nossa própria iluminação, e quando as barreiras de autoconsciência e das dúvidas são demolidas, descobrimos que nossa natureza de Buda transcende o nascimento e morte, eu e outros. Ela é a realidade não dual da dinâmica e interdependente natureza de todas as coisas para a qual se despertou o Buda Shakyamuni enquanto estava sentado sob a árvore Bodhi.


No Budismo de Nichiren, aprendemos que esse ensinamento não é o produto de especulação intelectual, ou um aperfeiçoamento moral, ou qualquer ato de auto-sacrifício. Isto só vem através da fé. Não é fé como uma crença cega, mas a fé é a confiança na verdadeira natureza da realidade – a confiança de que o que Buda ensinou no Sutra do Lótus é verdade e que o seu despertar é o nosso despertar para a nossa própria natureza verdadeira. Por isso cantamos Namu Myoho Renge Kyo – “Eu busco refúgio no Sutra do Lótus do Dharma Maravilhoso”. Esta frase simples, mas profunda, é uma expressão do despertar em nossas vidas, que nos permite realmente realizar a grandeza dos três tesouros e avançar na prática tripla – não com o objetivo de despertar, mas para expressar um despertar que já é a mais profunda verdade de nossas vidas mas, até agora desconhecida.

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