“O Buda apareceu neste mundo para purificar todos os seres
fazendo com que eles abram o tesouro da compaixão do Buda
o qual eles não têm conhecimento de possuir dentro de si.
Os Budas aparecem neste mundo para mostrar a Compaixão do Buda aos seres.
Os Budas aparecem neste mundo para fazê-los entender o que é a compaixão do Buda.
Os Budas aparecem neste mundo para guiar os seres ao caminho da compaixão do Buda.”

— Sutra da Flor de Lótus, capítulo II

O Sutra de Lótus é composto de vinte e oito capítulos os quais contem o Dharma que representa o auge da essência dos ensinamentos do Buda Shakyamuni. O Dharma é transmitido em um belo texto escrito em prosa e versos por meio de parábolas, alegorias, metáforas, fantásticas descrições de visões sobrenaturais e discussões metafísicas. Este panorama do todo dá uma dimensão de proporção cósmica no espaço e tempo. A variada natureza dos ensinamentos do Lótus é associada à habilidade metódica de Shakyamuni com sua delicadeza e conveniência para adequar de todos os modos às capacidades e temperamentos de todos os seus ouvintes. Em última análise, diferentes meios de guiar para o caminho.

Dois temas centrais se revelam no Sutra da Flor de Lótus. O primeiro, desenvolvido ao longo dos quatorze primeiros capítulos, é a realidade da natureza intrinseca que pravelece em todos os seres humanos. Atingir a iluminação consiste em despertar a semente da natureza búdica em si.

O outro tema central, exposto nos quatorze capítulos restantes fala sobre a eternidade do Buda. O Buda histórico Shakyamuni, que nasceu e atingiu a iluminação na Índia, foi apenas uma forma temporária do Buda primitivo que atingiu a iluminação no passado remoto e vive na eternidade livre do nascimento e morte. Independente da época em que vivemos, o Buda está sempre entre nós e aponta o caminho para a Iluminação.

 

LENDO O SUTRA DO LÓTUS

por rev. Yodo Okuda Shonin

O nome correto do Sutra do Lótus é Myou hou ren ge kyou, que significa “o ensino superior mais elevado como a flor do lótus branco).Foi traduzido em 406 D.C por um monge chamado Kumārajīva (Kumarajuu) na era Youshin, na China. O Sutra do Lótus é uma magnífica história composta por 28 capítulos compilados em 8 volumes.

Características do Sutra do Lótus

O Sutra do Lótus é dividido em 3 partes. Do 1º capítulo, a “Introdução”, até o 10º, “O Mestre da Lei”, é composto pela parte em que Buda Shakyamuni fala no Monte Gridrakuta, na Índia; a 2ª parte, que muda no meio do 10º capítulo, chamado “O Aparecimento da Torre do Tesouro”, vai até o 22º capítulo, “Transmissão”, em que fala-se sobre o Vácuo, ou seja, o sermão no mundo dos Budas puros; do 23º capítulo, “Os Feitos Passados do Bodhisattva Rei da Medicina (Bhaishagyarâga)”, até o 28º capítulo (o último), intitulado de “O Incentivo do Boddhisattva Universalmente Meritório (Smantabhadra)” compõem a parte em que Buda Shakyamuni desce ao Monte Gridhrakuta. Essas duas cenas que mostram os 3 sermões são chamadas de “Nisho San E(ou Ne) ”.

Agora vamos observar a questão da duração do tempo. No Sutra do Lótus é demonstrado que esse Sutra é entoado por um longo tempo. Esse tempo é apresentado em dois tipos numéricos: o Sanzen Jindengou, e o Gohyakuoku Jindengou. A unidade “jindengou” refere-se ao tempo que se gasta ao transformar o mundo em pó e, tendo em mãos os grãos, andar sempre em direção ao leste, caminhando e jogando um grão em cada mundo que se passa, até acabarem todos os grãos. A numeração Sanzen Jindengou que aparece no capítulo 7, “A Parábola da Cidade Fantasma” apresenta o tempo gasto na distribuição, em direção ao leste, das 3 porções de mil grãos cada transformadas a partir de 3 tipos de mundo – pequeno, médio e grande – que se juntaram em porções de mil, ou seja, 3 mil mundos. O “Gohyakuoku Jindengou”, apresentado no capítulo 16, “A Duração da Vida do Tathagata”, é um número ainda maior, e no sermão existe o número “Gohyakusenman oku Nayuta Asougi”, um número gigante na 56ª potência de 500x10milhõesx100milhõesx100bilhõesx10, multiplicado por 3 mil mundos transformados em migalhas. É a representação numérica do tempo gasto, após a passagem pela mesma quantidade de mundos esmigalhados no lado Leste, na distribuição dos mundos transformados em pó, jogados um por um até o último a ser distribuído. Como são números indianos, os tempos são equivalentes ao infinito. Mas vamos verificar que dentro do sermão a duração desses dois tipos de tempo é empregada de formas totalmente diversas.

Na expansão do grandioso mundo do Sutra da Flor do Lótus, Buda Shakyamuni faz o sermão, e os discípulos que o escutam voltam-se a Ele e entoam o sermão de volta para confirmar se entenderam corretamente. É nesse momento que utilizam a Metáfora. Uma das peculiaridades do Sutra do Lótus é ensinar por meio da Metáfora e existem 7 oficiais, chamadas “Hokkeshichiyu”. Essas metáforas são diversas histórias; a relação entre nós e Buda Shakyamuni é contada pela relação entre pais e filhos, amigos, chuva e grama, aquele que conduz e as pessoas, o rei e os soldados.

Além das Metáforas, existem outros dois meios expeditos de sermão do Sutra da Flor do Lótus. Um deles é interpretar sem artífices o mundo da iluminação espiritual que o próprio Buda Shakyamuni alcançou, e o outro é interpretar por meio da relação com o Ele na encarnação anterior. Existem 3 meios expeditos porque o Buda Shakyamuni divide a forma como ensina de acordo com a habilidade da pessoa. O primeiro método é utilizado para aqueles que têm estudado o budismo por um longo tempo e compreendem bem os ensinamentos de Shakyamuni, ou seja, é um método utilizado somente entre os melhores discípulos, entre eles o Shariputra. O método da Metáfora é utilizado entre os discípulos que vêm logo em seguida, aqueles que tem a habilidade de compreender (os 4 Sravakas), e o terceiro método, que consiste em utilizar a história da encarnação passada, é o último deles e significa esclarecer o laço existente entre Buda Shakyamuni e todos, desde o passado até o agora. Esse agora é o tempo que Shakyamuni está passando o sermão e que conduz todos os ouvintes ao mundo do despertamento.

Com essas peculiaridades explicadas, vamos ao conteúdo. Primeiramente, na cena inicial, gostaria de observar do capítulo introdutório até o 10º capítulo.

Monte Gridhrakuta – do 1º ao 10º capítulo

A introdução começa com “Nyozen Gamon”, em que há a explicação da cena em que o Sutra começa a ser entoado.

O local é aquele que citamos no começo, o monte Gridhrakuta. O público, no qual encontravam-se também os 10 discípulos famosos de Buda (entre eles, o filho de Buda, Lagola), além de 18 Bodhisattvas, entre os quais se encontrava a deusa Kannon, outros que protegiam muitos de seus deuses, homens e mulheres religiosos se reuniram. A mãe adotiva de Shakyamuni, Mahaprajapati e a esposa Yashodhara também estavam presentes. O rei Ajase, famoso por ter matado seu pai, também esperava pelo sermão de Shakyamuni. De repente, ocorrem inúmeros acontecimentos estranhos como o tremor do chão, uma chuva de flores e um raio disparado entre as sobrancelhas de Buda Sakyamamuni. Aqui, 2 bodhisattvas conversam entre si, Maitreya, o que faz perguntas, e Manjushri, o que responde. Durante o diálogo dos dois, relembram que num passado longínquo, na era do passado de Shakyamuni, um fenômeno semelhante havia acontecido. Com todos esses estranhos fenômenos, fica claro que um grande ensinamento está preste a ser passado.

No 2º capítulo, “Meios Expeditos”, finalmente o grande ensinamento de Shakyamuni é entoado e a partir daqui o palco é tomado somente por Ele. Diferente de outros sutras, em que uma pessoa do público faz perguntas e Shakyamuni responde, Ele entoa o ensinamento por vontade própria. Podemos entender o quão importante é o ensinamento. Seu parceiro é um Shariputra que compreende muito bem o ensinamento de Shakyamuni. Ao Shariputra ele conta o seguinte:

“Muitos Budas que alcançaram a iluminação passaram por um longo treinamento, prestaram favores a inúmeros Budas e assim tornaram-se Budas. Para explicar o complexo mundo da iluminação de uma forma simples, os Buddhas vieram mostrando o caminho ao povo por meio de variados meios expeditos como a Metáfora e histórias do passado. Porém, este ensinamento deve ser passado de Buda para Buda e, portanto, não posso ensiná-los a vocês.”

O conteúdo da Lei aqui revelada é “Shohou Jissou” e “Juunyoze”. No Sutra da Flor do Lótus, o conteúdo da Lei de Buda é somente entoado nesse 2º capítulo. A explicação do conteúdo é feita no 16º capítulo, mas o nome da Lei é claramente citado nessa parte. Mas o que seria o “Shohou Jissou”?

Shohou significa a existência e fenômenos reais deste mundo; significa que a realidade tal como é representa a verdade. Dividindo o “Jissou” detalhadamente, obtemos o “Juunyoze”, 10 tópicos que são a aparência, caráter, forma, habilidade, mecanismo de trabalho, fatores passados, relações, resultado e futuro, além da existência igualitária de todos eles juntos. Esta é a explicação filosófica, mas é a Lei de Buda e é um ensinamento realmente difícil.

Portanto, Shakyamuni recusa-se a passar o ensinamento ao Shariputra. Isso ocorre porque o ensinamento é diferente de todos passados até agora e há o risco de discípulos que pensam ter compreendido o ensinamento de Shakyamuni, ou aqueles que não possuem a habilidade de compreender o ensinamento, entenderem erroneamente e cair no caminho errado. Porém, o Shariputra pede a Shakyamuni que lhe ensine a Lei. Após 3 conversas em que o Shariputra pede para lhe passar o ensinamento e Shakyamuni recusa, Ele acaba cedendo ao entusiasmo de seu discípulo e decide lhe ensinar.

Todavia, nesse momento, 3000 pessoas que pensaram que não há necessidade de escutar o ensinamento de Shakyamuni retiraram-se do local. Essas pessoas são chamadas de “arrogantes intolerantes” e referem-se àqueles que não compreenderam a Lei, embora insinuem ter compreendido-a. Essas pessoas são chamadas de “Zoujouman” e referem-se àqueles que não compreenderam a Lei, embora insinuem, arrogantemente, ter compreendido-a. Shakyamuni não tentou impedi-las. Havia pensado que pessoas que não escutam não têm a habilidade de ouvir atentamente e que não haveria nada a fazer a respeito. Existe aqui um importante ensinamento do Sutra da Flor do Lótus: “ouvir o que o outro fala”. Se somente pensamos sobre nós mesmos, não escutamos o que uma pessoa fala. Pode-se dizer que o primeiro ensinamento do Sutra do Lótus é sempre ouvir humildemente a conversa de uma pessoa.

Shakyamuni esclarece a razão pela qual apareceu neste mundo para as pessoas que permaneceram a fim de ouvir seu ensinamento.

“A razão pela qual vim a esse mundo é fazer com que aqueles que vivem percebam a visão e o pensamento Búdico que possuem, indicá-los, iluminem-se e entrem nesse mundo. Esse ensinamento já foi utilizado em outros Sutras além do Sutra do Lótus. Descartando imediatamente o oportunismo, transmitirei o ensinamento a vocês para tornarem-se Budas.”

Por razões de tempo, não entrarei em detalhes. Termino assim o conteúdo principal do 2º capítulo. Pode-se dizer que é no capítulo “Meios Expeditos” que estão os ensinamentos mais importantes. Do 3º capítulo (“Metáfora”) ao 9ºcapítulo (“Profecias Conferidas aos Aprendizes e Adeptos”) é entoado sobre a promessa de Buda à futura transformação em Buda. Chamamos isso de “Juki”. Os protagonistas aqui são os Sravakas e os Pratyekabuddhas.

Os Sravakas e Pratyekabuddhas são os típicos discípulos budistas que escutam com bastante seriedade os ensinamentos de Buda para alcançar a iluminação e que se esforçam nos treinamentos. Porém, a dedicação demasiada em si mesmos faz com que Shakyamuni não admita que tenham alcançado a iluminação. Isso se deve ao fato de que, por pensarem somente em si mesmos, não ajudaram as pessoas ao seu redor. Portanto, em outros sutras que Shakyamuni entoou, ensina que essas pessoas não podem elevar-se espiritualmente.

Ao chegar o tempo de entoar o Sutra da Flor do Lótus, Shakyamuni finalmente admite a elevação espiritual dessas pessoas, pois compreenderam muito bem o ensinamento entoado no 2º capítulo. Shakyamuni promete tornar todos os seus discípulos, entre eles o Shariputra, em Budas no futuro. Essa parte, também, mostra o lugar em que o Sutra do Lótus diverge-se com outros sutras. Basicamente, o ensinamento desse Sutra significa a proteção a todos os seres vivos do mesmo modo que a chuva que cái sobre plantas e árvores.

Além disso, como foi esclarecido no 7º capitulo, é importante valorizar o laço que temos com Shakyamuni desde os tempos longínquos. Nesta parte, conta-se sobre a duração da história sobre o entoamento do Sutra do Lótus e significa que Ele vem mostrando o caminho como Senhor desse mundo de realidades, como nosso pai e professor. Nesse capítulo outros 15 Budas, dentre os quais inclui-se Amitabha Buda, aparecem e são considerados Budas que transmitem ensinamentos num mundo límpido a oeste. Basicamente, esses Budas não têm nenhuma relação conosco, e somente Shakyamuni protege-nos desse mundo de realidade coberto de cobiça.

Vácuo – do 11º capítulo ao 22º capítulo

A partir do capítulo 10, “O Mestre da Lei”, o conteúdo da conversa de Shakyamuni muda aos poucos. Ou seja, faz uma convocação para escolher aquele que disseminará seu ensinamento. Além disso, o Sutra da Flor do Lótus difere-se de outros ensinamentos, em que há a utilização de meios expeditos para serem entoados, e é um entoamento que ensina somente o caminho para tornar-se Buda. Mesmo que Shakyamuni entoasse diretamente, seria difícil de entendê-lo e Ele prevê que será muito mais difícil expandir seu conhecimento pelo mundo após sua partida, pois será criticado por aqueles que tiveram um entendimento equivocado sobre seu ensinamento. Portanto, a partir do 11º capítulo, o diálogo segue tendo como tema central a questão sobre quem irá expandir o Sutra do Lótus após a morte de Shakyamuni.

No capítulo 11, “O Aparecimento da Torre do Tesouro”, inicialmente é revelado que o ensinamento chamado Sutra da Flor do Lótus entoado por Shakyamuni é verdadeiro. O Buda que faz tal revelação é Prabhûtaratna (Muitos Tesouros).

No começo desse capítulo uma gigante torre que guarda e cultua o corpo de Prabhûtaratna surge repentinamente do solo. Surge uma voz de dentro da torre, ainda com os portões fechados.

“Tudo o que Shakyamuni falou até agora sobre o ensinamento chamado Sutra da Flor do Lótus é verdadeiro”.

Mahâpratibhâna (Grande Alegria da Pregação, um bodhisattva que detém uma grande habilidade retórica) indaga quem é o responsável pelo surgimento da torre e senhor daquela voz. Shakyamuni revela que o possuidor da voz é Prabhûtaratna; esse Buda do passado aparece sempre que o Sutra da Flor do Lótus é entoado e sempre atesta a veracidade do ensinamento. Obviamente, todos acabam desejando encontrá-lo, além de somente escutar sua voz. De repente, Prabhûtaratna impõe-lhes uma condição para abrirem as portas da torre. Eles devem reunir as emanações de Shakyamuni que estão em forma de Buda e que foram espalhadas pelos 8 cantos desse mundo cheio de cobiça, a fim de entoar o ensinamento. Shakyamuni emitiu um raio por entre suas sobrancelhas e junta as emanações em formas de Budas. Além disso, por meio da travessia desse mundo sujo por 3 vezes, o mundo é transformado em um mundo mais puro e prepara-se para abrir os portões da torre. Finalmente a torre abre-se e a figura de Prabhûtaratna aparece. O Buda declama palavras de louvor a Shakyamuni e faz com que muitos tesouros caiam do céu. De repente, Prabhûtaratna cede metade de seu assento no meio da torre, chama Shakyamuni para dentro dela, pede-Lhe para aproximar-se e faz com que Ele sente-se a seu lado. Essa parte em que os dois sentam-se lado a lado dentro da torre, faz menção ao mundo da Mandala. Então, Shakyamuni utiliza um poder misterioso para transferir o local para o Vácuo. Ele almeja fortemente que a expansão do Sutra da Flor deoLótus, a mais difícil tarefa, seja executada 3 vezes após Sua partida.

No 12º capítulo, “Devadatta”, e no 13º capítulo, “Admoestação para Abraçar o Sutra”, são mostrados ensinamentos do Sutra da Flor do Lótus que não existem em outros sutras. Um deles é visto na promessa de tornar Devadatta um Buda – ele tinha sido proibido de tornar-se Buda pelo crime que cometeu ferindo o Tathagata Shakyamuni – e o outro, no fato de permitir a filha do Rei Dragão, que tem um corpo animal e é do sexo feminino, alcançar a iluminação. No 13º capítulo, conta-se sobre a promessa de tornar possível a iluminação da mãe adotiva e da esposa de Shakyamuni, que são mulheres. Nos ensinamentos anteriores ao Sutra do Lótus, dizia-se que as mulheres não poderiam tornar-se Budas. Todavia, Shakyamuni fez com que isso fosse possível no ensinamento do Sutra da Flor de Lótus.

Além disso, nos 13º e 14º capítulos (“Práticas Pacíficas”), é apresentado o conhecimento para expandir o Sutra do Lótus.

Como existem muitas pessoas arrogantes que impedem a expansão do Sutra do Lótus, convence-se o público ouvinte que é necessário tolerar silenciosamente e assim ir entoando este sutra maravilhoso; indica as atitudes a serem tomadas e a maneira de lidar com os sentimentos que aquele que for expandir o conhecimento deve tomar cuidado.

Quando o Shakyamuni explicou até esse ponto, bodhisativas que almejavam tornar-se Buda se manifestaram da platéia e disseram seus nomes. Porém, Shakyamuni recusa todos os pedidos. Por que será? Por que será que Shakyamuni ignorou os sentimentos dos bodhisattvas que se candidataram?

Shakyamuni já havia ensinado várias vezes, mas não seria fácil expandir o Sutra da Flor do Lótus num mundo tão sujo como esse. O escolhido seria criticado, seria agredido. É preciso força para suportar e transgredir a tudo isso. Porém, os bodhisattvas que se candidataram são bodhisattvas vindos de terras estrangeiras das quais não temos conhecimento. Eles não poderiam agüentar. Shakyamuni sabia disso.

No momento em que o Honrado Pelo Mundo impediu os bodhisattvas candidatos, uma fissura surgiu como se o chão tivesse tremido e um surpreendente número de bodhisattvas emergiu por baixo do chão. Todos os bodhisattvas traziam um séquito consigo. Aqueles que estavam na vanguarda eram os quatro bodhisattvas: Visishtakâritra (Práticas Superiores), Anantakâritra (Práticas Ilimitadas), Visuddhakâritra (Práticas Puras), e Supratishthitakâritra (Práticas Firmemente Estabelecidas).

Os bodhisattvas que haviam se candidatado ficaram surpresos com a repentina aparição. Ao mesmo tempo em que ficaram espantados começaram a duvidar. Maitreya, representando os demais bodhisattvas, perguntou ao Shakyamuni. Quem são esses bodhisattvas e de onde são? Por que o Honrado pelo Mundo convocou-os? Existem entre eles bodhisattvas mais velhos do que Shakyamuni. Quem, afinal de contas, veio entoando o ensinamento a eles? Essa é a história contada no 15º capítulo “Emergindo da Terra” e a resposta é finalmente revelada no 16º capítulo “A Duração da Vida do Tathagata”. Resumidamente, é revelada a verdadeira face de Shakyamuni.

Na ocasião em que isso é esclarecido, Shakyamuni severamente chama a atenção de todos repetindo 3 vezes o seguinte: “Acreditem no que vou falar agora”. O bodhisattva Maitreya repete 3 vezes seu voto. Assim, Shakyamuni entoa que os presentes devem desviar os olhos do Shakyamuni registrado na história e voltá-los ao longínquo passado de Gohyaku Oku Jindengou para conhecer o Shakyamuni que veio expandindo o Sutra do Lótus desde quando havia se tornado Buda. Todos são guiados pela resposta de que os bodhisattvas que emergiram do solo foram convocados para certificar a vida eterna de Sakyamuni e que são discípulos d’Ele e, portanto, têm vínculo com este mundo maculado.

Pronuncia que, além disso, existem vários Budas que são todos, na verdade, Ele mesmo transfigurado em várias formas. Resumindo, no capítulo 16 é possível entender que Shakyamuni é a essência de todos os Budas que haviam aparecido. Porém, o Honrado Pelo Mundo afirma que entrará no Nirvana, ou seja, morrerá durante um Método e esconderá sua face, pois se Shakyamuni estiver sempre presente, acabaremos dependendo d’Ele. Ficaremos mimados e acabaremos não mais obedecendo. Não haverá mais obediência aos pais que dizem para tomarmos um remédio porque se está doente. Shakyamuni nos ensina que morrerá como um “Método” porque só entendemos sobre a necessidade de termos nossos pais quando eles já não estão mais por perto.

Assim, a revelação sobre a duração da vida de Shakyamuni que estará eternamente perto de nós significa que Ele estará sempre conosco onde quer que estejamos. É possível obter alegria e alívio de acordo com a crença nessas palavras. Portanto, do 17º ao 19º capítulo o mérito daqueles que souberam que a vida de Shakyamuni é infinita é entoado.

A propósito, como deve ter ficado a história sobre a tarefa de expandir o Sutra da Flor do Lótus? Isso é entoado nos capítulos 20, 21 e 22, “O Bodhisattva Nunca Desprezando”, “Os Poderes Místicos do Tathagata” e “Transmissão”, respectivamente. O encargo de expandir o Sutra do Lótus nesse mundo maculado após Shakyamuni ter apagado sua imagem é passado aos bodhisattvas que emergiram do solo e assim, Shakyamuni transmite um importante ensinamento secreto a eles. Além disso, pede aos bodhisattvas de outro mundo aprenderem o Sutra da Flor de Lótus e propagá-lo. A diferença é que a difusão deve ser feita em nosso mundo maculado, sendo esse o ensinamento secreto de extrema importância. E sobre a forma de expansão, têm a missão de levá-la em frente demonstrando respeito à possibilidade que todos têm de um dia tornar-se Buda e simplesmente cultuar. Esse é um árduo treinamento. Devem cultuar uma pessoa, mesmo que esta tenha agredido-os. Para propagar o Sutra da Flor de Lótus devem transgredir tudo. Deixando de desprezar aquele ao seu lado e repetindo esse ato constantemente, faz com que o sentimento dessa pessoa mude e ela passe a acreditar em você. Isso significa não desprezar a si mesmo. Esse é o treinamento dos bodhisattvas que aparecem no 20º capítulo e é a prática da expansão do Sutra da Flor de Lótus.

Encerramento – do 23º capítulo ao 28º capítulo

Os últimos 6 capítulos referem-se ao entoamento após terem retornado do Vácuo e voltado ao Monte Gridhrakuta. Neles são entoados os méritos de vários adeptos e difusores do Sutra do Lótus como o passado de Bhaishagyarâga (o bodhisattva Rei da Medicina), Gadvadasgara (o bodhisattva Mioson, de fala clara e explicativa), o mérito de Kannon, a promessa dos deuses em proteger aqueles que propagam o Sutra do Lótus, a história do rei que converteu sua crença ao conhecer o Sutra e a promessa de Samantabhadra (o bodhisattva Universalmente Meritório).

Desses sutras, o que mais aprecio é o da deusa Kannon, que nos protege transfigurando-se em 33 tipos de formas. “Kannon” significa “aquele que consegue escutar as vozes das pessoas”. É um bodhisattva que escuta as vozes de pessoas em sofrimento e estende a mão em socorro. Neste sutra, um bodhisattva impressiona-se com a magnificência de Kannon e oferta um tesouro à deusa. Porém, ela não aceita o presente. Shakyamuni convence-a de que é um sentimento e que, portanto, deveria aceitá-lo. Ao recebê-lo, divide o presente em duas partes, adornando os pescoços de Shakyamuni e Prabhûtaratna como símbolo de oferenda aos dois.

Bem, vim falando longamente sobre o ensinamento do Sutra da Flor do Lótus, porém não há como contar a história integralmente. Existem muitas coisas das quais gostaria de contar-lhes, mas penso em resumir a história do Sutra da seguinte forma:

Primeiro, que a iluminação de Shakyamuni é a aceitação de todas as existências como elas são. Significa aceitar a morte como a morte, a enfermidade como a enfermidade. Esse ensinamento, entoado no 2º capítulo, é explicado no 16º capítulo do ponto de vista de Buda sobre o mundo e, diz em seu registro que se deve aceitar as coisas como são em vez de julgar por dois valores opostos como o bem e o mal, a existência e a ausência. É fácil falar, o difícil, no entanto, é fazer. É o que chamamos de “Jiga” (“ego”, em japonês), e é necessário reter a decisão do ego e tornar-se aberto às coisas para aceitá-las do jeito que são. É centralizar as coisas em si, sem fechar o círculo para si mesmo. Para tanto, é preciso uma forte força de vontade e uma forte crença em Shakyamuni. A crença n’Ele é conduzida de acordo com nossa relação com Ele desde os tempos longínquos.

Shakyamuni, que sempre nos protege nesse mundo real. Gostaríamos de adquirir logo toda vossa sabedoria e visão. E existem o Buda e o “ser Buda”. Este é o ensinamento eterno do Honrado pelo Mundo revelado no Sutra da Flor do Lótus.